sábado, 13 de novembro de 2010

Promessas e...

Artigo postado no Blog do Racardo Noblat em 13.11.2010

Promessas e compromissos - Ruy Fabiano

 Promessas de campanha e compromissos de governo são mercadorias distintas, diz uma máxima política não escrita. E exatamente porque não é escrita é seguida fielmente. Na campanha eleitoral recém-finda, que evitou deliberadamente os grandes temas, a presidente eleita fez poucas promessas concretas.
Entre elas, não criar ou aumentar impostos, não mexer na liberdade de imprensa e não mexer no tripé econômico: responsabilidade fiscal, câmbio flutuante e metas de inflação.
Dois dias após as eleições, em entrevista ao lado de Lula, as promessas começaram a ser desfeitas. A primeira foi a tributária. Lula fez a apologia da CPMF e Dilma disse que, não por ela, claro, mas pelos governadores eleitos, que a estariam pressionando, teria que pensar em ressuscitar aquele tributo, cuja revogação representou o maior revés parlamentar de Lula.
Na quinta-feira, no programa de rádio Bom Dia Ministro, Paulo Bernardo, do Planejamento, cotado para permanecer no cargo por sugestão de Lula, avisava que não está descartada, no futuro governo, a criação de impostos. E repetia o bordão segundo o qual economia "é que nem em casa, não tem mágica". A mágica fica por conta do discurso de campanha, que tem solução indolor para tudo.
Paralelamente, o ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social, Franklin Martins, retomava o tema do controle social da mídia. Num seminário, promovido pelo governo, voltou a falar no assunto, que havia constado do primeiro programa de governo que Dilma registrara no TSE, retirando-o a seguir, em face das reações.
Dilma, na ocasião, jurou que havia sido um engano: o partido imprimira o arquivo errado e ela o rubricara sem ler. Passou a repetir que o único controle da mídia que admite – e admitirá - é o controle remoto. Não é bem assim: o tema é bandeira histórica do PT, aprovado em conferência nacional do partido e inscrito no 3º Programa Nacional de Direitos Humanos, elaborado pela Casa Civil da Presidência da República, ao tempo em que Dilma a comandava.
Está, pois, em curso, sim – e com o endosso dos governos petistas nos estados -, um plano estatal de controle da mídia.
Por fim, o controle do câmbio. Dilma declarou anteontem, em Seul, onde participou da reunião do G-20, ao lado de Lula, que a valorização do real "não é boa para o Brasil" e que tomará "todas as medidas possíveis" (não disse quais) para contê-la.
É claro que o futuro governo não poderá ignorar a guerra cambial deflagrada por China e Estados Unidos. Mas é claro também que essa guerra não foi deflagrada esta semana.
Já estava em curso na campanha, quando a jura de intocabilidade no câmbio flutuante foi feita – e sustentada a seguir, na entrevista que, já eleita, deu ao Jornal Nacional, quando garantiu: “Eu tenho um compromisso forte com a questão dos pilares da estabilidade macroeconômica, um câmbio flutuante”.
Pelo visto, já não tem. Como as campanhas submetem-se a critérios de marketing, monitorados por pesquisas, questões essenciais são evitadas – ou tergiversadas (para usar um termo caro a Dilma). O câmbio foi um deles. Serra chegou a abordá-lo e provocou reações fortes no mercado financeiro e entre os correligionários, sendo aconselhado a não mais reincidir.
Pior que omitir é mentir, casos específicos da questão tributária e da liberdade de imprensa. Quando se fala em reforma política, pensa-se apenas em mudanças pontuais nas regras de organização dos partidos e do sistema eleitoral, jamais na necessidade de transformar promessa em compromisso - e compromisso em dever.
Somente nessa hipótese as campanhas ganhariam consistência e deixariam de provocar no eleitor a desconfortável sensação de estelionato antecipado, que conspira contra a credibilidade não apenas dos políticos, mas da própria política.

Ruy Fabiano é jornalista

Acesse o link:
http://oglobo.globo.com/pais/noblat/posts/2010/11/13/promessas-compromissos-340514.asp
Fonte: http://oglobo.globo.com/pais/noblat/

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