O Globo - Editorial - 06/02/2011
A dificuldade da tarefa do governo Dilma Rousseff de recolocar as contas públicas nos trilhos é proporcional ao pouco caso com que o governo, especialmente em 2010, inflou os gastos, num estrago fiscal que as manobras e os artifícios contábeis não conseguiram nem de longe disfarçar.
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, reagiu como militante do PT, e não como economista, à correta referência feita em documento do FMI à deterioração das finanças públicas brasileiras. Para ele, a crítica se devia a algum “velho ortodoxo” entrincheirado na sede do fundo, em Washington.
A acidez do comentário não consegue ofuscar o tamanho do problema. Por contingências técnicas e até limitações físicas, a economia brasileira não conseguiria manter a taxa média de crescimento do ano passado, acima de 7%, por muito tempo.
Os dois principais termômetros do nível de atividade — inflação e as contas externas — há algum tempo começaram a sinalizar o excesso de velocidade.
A preocupação demonstrada pelo novo governo com o tema faz todo sentido, pois são cruciais o controle da inflação, próxima dos 6% e se distanciando do centro da meta (4,5%), e a manutenção da tranquilidade no setor externo — hoje garantida por reservas que se aproximam dos US$ 300 bilhões —, numa conjuntura mundial de futuro ainda incerto.
Com o Congresso em funcionamento, o Palácio dá sequência a duas negociações estratégicas: sobre o salário mínimo, em que a presidente, para reajustá-lo, deseja seguir a regra estabelecida no governo passado em comum acordo com os próprios sindicatos; e o Orçamento de 2011, impossível de ser executado sem cortes — a não ser que alguém em Brasília deseje ir contra a manutenção da estabilidade econômica, já incorporada ao patrimônio da sociedade.
A dimensão das maquiagens e manobras contábeis para se fechar o superávit primário do ano passado (receitas deduzidas de todas as despesas, exceto os juros da dívida pública) em 2,78% do PIB — abaixo da meta de 3,1% — indica o esforço que será necessário para reequilibrar as contas públicas.
Alguns economistas calculam que, sem criatividade contábil — como transformar uma operação de capitalização da Petrobras em receita do Tesouro (!) —, o superávit efetivo ficou abaixo dos 2% do PIB.
Esta economia é feita para pagar a conta dos juros da dívida pública. Quanto menor ela for, mais dívidas a União tem de contrair para arcar com os juros. Entra-se no conhecido processo de endividamento em bola de neve.
O Brasil, em sua História, padeceu de todo tipo de crise — inclusive a de insolvência interna.
A ideia inicial do governo é perseguir a meta “cheia” do superávit (3,1% do PIB). Entenda-se, sem malabarismos e jogo de espelho — de resto, inúteis, pois os analistas logo identificam o excesso de esperteza.
Significa buscar uma economia adicional de mais de um ponto percentual de PIB, sem contar com a alternativa do aumento de impostos — usada à larga nos últimos 16 anos.
Não será fácil, mas precisa ser feito
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