O Globo - 01/02/2011
Luiz Garcia
Um teste para sua esperteza: o que está errado nestas três manchetes, todas do jornal de domingo? "Municípios não têm Defesa Civil adequada", "Petrópolis destina poucas verbas para catástrofes" e "Evitar as tragédias não é só fazer obras"?
Nenhuma delas é mentirosa nem exagerada. O erro é nosso (no caso, do GLOBO; na verdade, da mídia toda). Todo mundo sabe que, mais ou menos na virada do ano, tão certo como o Natal e o Ano Novo, chove forte nas encostas e nos vales da Serra do Mar fluminense. E o que se faz a respeito? Nada. E a mídia, bota a boca no trombone? Bota — mas só depois das chuvas, com raras exceções e frágil insistência.
As reportagens do Globo dominical denunciam uma extraordinária falta de preparo de autoridades municipais e estaduais para enfrentar as tempestades. Os órgãos de defesa civil não têm autonomia nem verbas próprias. São apêndices de secretarias. E isso vale para municípios de todos os tamanhos, de Petrópolis a Bom Jardim, de Friburgo a Areal.
Em quase todos os casos, há uma desculpa genérica: falta de recursos. Exemplos: São José do Vale do Rio Preto tem quatro técnicos e um carro emprestado para atender aos possíveis problemas de mais de 20 mil moradores. Nova Friburgo, com quase mil quilômetros quadrados, dispõe de 22 técnicos e dois veículos caindo aos pedaços.
O Ministério das Cidades criou, já há algum tempo, o Plano de Redução de Riscos, que inclui o óbvio indispensável: obras estruturais e um sistema de alerta e mobilização dos moradores. Poucas prefeituras aderiram a ele. Culpa dos prefeitos, pode ser. Mas a responsabilidade é também da autoridade federal, que poderia, pelo menos, botar a boca no trombone, na esperança de que uma reação da opinião pública local acordasse os prefeitos e seus secretários.
Há exemplos duros de engolir. Como no caso da previsão meteorológica. Especialistas dizem que o trabalho nessas áreas é de bom nível — desmentindo a velha piada que define meteorologista como aquele sujeito de calção de banho debaixo do temporal — mas denunciam a escassez de técnicos, que impede o trabalho noturno. Este ano, as chuvas mais fortes na Região Serrana foram de madrugada.
Enfim, todos os problemas e deficiências são conhecidos. Só há um probleminha: eles só vêm à tona depois das chuvas. É assim todo ano. Portanto, está aí uma missão para todos os chefes de reportagem de toda a mídia deste nosso Sudoeste: no fim do ano, programar reportagens e levantamentos sobre os mecanismos oficiais de previsão do tempo. Ou seja, vamos discutir a chuva com o sol lá em cima, ainda brilhando.
Texto publicado no Globo de hoje
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